quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Instrução vai detalhar casos em que podem ser feitas construções em condomínios

Já existe um decreto autorizando algumas intervenções, mas as administrações regionais não o cumprem

Helena Mader


Mesmo com uma legislação que autoriza obras em condomínios irregulares, os moradores e proprietários de lotes não conseguem obter alvarás nas administrações regionais. O Decreto nº 29.562, publicado no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) em setembro do ano passado, autorizou as construções em três casos: pequenas reformas em casas habitadas; conclusão de obras iniciadas até 1º de janeiro de 2007; ou início de edificações em parcelamentos com projetos já aprovados. Mas, sete meses depois, as administrações resistem a emitir alvarás para moradores de condomínios. Para resolver esse impasse, o governo publica amanhã uma instrução normativa com mais detalhes sobre as regras. O objetivo é obrigar as administrações regionais a autorizarem as obras passíveis de licenciamento.

A medida vai beneficiar mais de 500 mil pessoas que vivem em áreas irregulares. O gerente de Regularização de Condomínios, Paulo Serejo, explica que a instrução normativa vai sanar as dúvidas que ainda restam entre os administradores das cidades. “O decreto não está sendo cumprido e precisamos resolver esse problema. Hoje, muitas pessoas tentam rebocar uma casa já pronta e têm a obra embargada”, explica Serejo. “O decreto foi elaborado com base no Código de Edificações. Não podemos usar a legislação apenas para punir os cidadãos”, acrescenta o gerente.

A lentidão para autorizar obras abre brecha para ilegalidades. Cenas de obras em parcelamentos irregulares são comuns em condomínios de todas as regiões do DF. A ideia do GDF é controlar as novas edificações, autorizando o que for possível e demolindo o que estiver em áreas de preservação ambiental.

Com a instrução normativa, serão esclarecidos os tipos de obras permitidos e em quais circunstâncias. A nova legislação também vai sugerir documentos que as administrações regionais podem cobrar dos moradores para a comprovação da data de início da edificação, como notas fiscais de material de construção, contas de luz ou carnês de IPTU.

A partir da publicação da instrução normativa, as administrações vão começar a liberar os alvarás de construção. Quem garante é o coordenador das Cidades, Írio Depieri — responsável por todas as 29 unidades regionais do DF. “O decreto era muito genérico e, por isso, tínhamos uma orientação de não conceder o licenciamento. Os administradores não se sentiam seguros para conceder a documentação”, explica Depieri.

Reivindicação
A perspectiva de uma nova legislação animou a comunidade dos parcelamentos irregulares. A presidente da União dos Condomínios Horizontais, Júnia Bittencourt, conta que essa é a maior reivindicação da comunidade. “A falta de autorizações leva as pessoas a construírem ilegalmente. Elas acabam se arriscando e, muitas vezes, isso acaba em derrubadas”, destaca Júnia. “De todas as administrações regionais, somente a do Jardim Botânico vem cumprindo o decreto. Em Sobradinho, no Gama e em Planaltina, por exemplo, ninguém consegue licenciar as construções”, finaliza a líder comunitária.

Uma das beneficiadas pela instrução normativa pode ser a comerciante Eliane Oliveira Brito, 42 anos. Ela mantém uma loja de materiais de construção na entrada do Grande Colorado há mais de 15 anos e, em maio de 2008, decidiu começar uma reforma no local. Um mês após o início das obras, a dona da loja recebeu a primeira notificação. “Nós continuamos com o trabalho mas, depois do embargo, decidimos parar. Tenho medo de eles derrubarem o que eu já construí”, preocupa-se. Eliane procurou a Administração Regional de Sobradinho para tentar resolver o impasse, mas nunca obteve resposta aos pedidos de licenciamento.

A comerciante reuniu diversas fotos para comprovar que o imóvel já existia há mais de 15 anos. “Quero agir de maneira correta, mas ninguém me mostra uma solução. Por que não posso reformar um prédio que é da família, comprado há mais de 20 anos?”, questiona. Agora, com a loja fechada, Eliane teve que despedir os funcionários e estocar todo o material comprado para a reforma.

Derrubadas
Algumas pessoas que insistiram em construir sem alvará, entretanto, viram a edificação ser derrubada. Uma moradora do condomínio Parque Colorado, que não quis se identificar, teve as obras demolidas no último dia 14. Ela tentou licenciar a edificação mas, como não teve resposta da Administração de Sobradinho, retomou uma construção parada desde 2006. “Derrubaram tudo, até os muros e o portão. Fiquei sem casa e com uma dívida de R$ 140 mil. Meu marido teve até um princípio de infarto por causa da derrubada”, contou.

Até mesmo no condomínio Entre Lagos, que já tem projeto urbanístico aprovado e licença ambiental de instalação emitida, os moradores não conseguem alvará para tocar ou iniciar obras. O síndico do parcelamento, Adilson Barreto, conta que é comum o embargo de edificações no condomínio. “Mesmo com o decreto que determinou a liberação de algumas obras, as administrações regionais não cumprem a legislação. O condomínio já foi regularizado, falta apenas o registro em cartório”, conta Barreto.
As regras

O que prevê o Decreto nº 29.562/08:

» Podem ser licenciadas obras iniciadas até 1º de janeiro de 2007, em caso de lotes residenciais unifamiliares, comerciais e de uso misto, em condomínios em processo de regularização.

» Pequenas reformas como colocação de reboco, troca de revestimento, reparos na rede elétrica ou substituição de telhas podem ser liberadas em qualquer condomínio.

» Os lotes vazios localizados em condomínios irregulares com projeto urbanístico e licença ambiental aprovadas podem ter alvará para edificação.

» Serão aplicáveis as normas de gabarito, as taxas de ocupação e de construção e todos os demais parâmetros urbanísticos que mais se assemelhem ao lote a ser edificado em função da região e da metragem dos lotes.

» O decreto não vale para áreas de preservação permanente (APP).

O que estará na instrução normativa:

» Normas de gabarito de algumas regiões e parâmetros de construção que podem ser aplicados a vários tipos de lotes.

» Sugestões de documentos que os administradores podem exigir para saber se o ocupante é de boa-fé.

» Detalhamento das normas do decreto.